Por Stefano Palmieri
Grupo dos Trabalhadores do CESE

Os relatórios de Enrico Letta e Mario Draghi sobrepõem-se consideravelmente, apesar de diferirem bastante na sua análise e nas estratégias propostas.

Veja-se, por exemplo, a política de coesão. Desempenha um papel central no Relatório Letta, segundo o qual a política de coesão assegura que os benefícios do mercado único são partilhados entre todos os cidadãos e regiões da União. O relatório destaca igualmente a ligação entre a política de coesão e os serviços de interesse geral, que são essenciais por permitirem aos europeus viver e trabalhar no local da sua escolha. Em contrapartida, o Relatório Draghi parece negligenciar a importância da política de coesão e as dimensões social e territorial da competitividade. Aborda a competitividade europeia sem ter em conta as disparidades territoriais, subentendendo-se que o simples reforço da competitividade global da UE resolveria as questões regionais. Ignora que, para muitas regiões, a baixa competitividade e as desvantagens territoriais são duas faces da mesma moeda.

Ambos os relatórios reconhecem que manter a situação como está já não é opção para a União Europeia. A urgência e a complexidade das crises atuais exigem uma viragem significativa na elaboração das políticas europeias, possivelmente mesmo através de alterações aos Tratados. Podemos realmente debater o alargamento sem abordar a necessidade de uma integração política mais profunda? Essa viragem deve implicar também uma mudança de escala. O atual quadro financeiro plurianual (QFP) é insuficiente, alicerçado em pouco mais de 1% do RNB da UE e limitado pela lógica obsoleta da «contrapartida justa». É necessária uma nova abordagem, inspirada no modelo do NextGenerationEU. Desafios extraordinários enfrentam-se com soluções audazes, incluindo a emissão de «ativos seguros comuns», como se verificou durante a pandemia.

O próximo QFP 2028-2034 será um teste às verdadeiras intenções da UE, uma vez que estabelece as prioridades para esses sete anos. Neste contexto, é razoável que se espere um debate aberto sobre os desafios que a UE enfrenta, tendo em conta as múltiplas crises em curso, bem como sobre os seus principais objetivos e os bens europeus comuns que visa proporcionar aos seus cidadãos.

Ao ponderar reformas regulamentares, como recomendado nos dois relatórios, é importante recordar que a UE é a «economia social de mercado» mais avançada do mundo. As suas elevadas normas económicas, sociais e ambientais não constituem um obstáculo a este modelo e, pelo contrário, são essenciais para o seu êxito. Por conseguinte, comparar a regulamentação da UE com a dos EUA ou da China é essencialmente um erro. Qualquer esforço para simplificar as regras da UE deve assegurar que se salvaguardam as condições de trabalho, a segurança dos trabalhadores, os direitos dos consumidores, a coesão social e económica e o crescimento sustentável.

A Europa compreendeu, ainda que tardiamente, que já não basta ser um grande mercado. Para progredir, deve ambicionar maior unidade, incluindo uma integração política mais profunda e políticas verdadeiramente uniformes nos domínios da economia, da indústria, do comércio, dos negócios estrangeiros e da defesa. Os próximos meses serão decisivos para moldar o futuro da Europa.